Os relatos da Paixão seguem um após o outro no decurso desta semana. Hoje lemos de São Lucas. Nesta Missa, em que quase todos os textos falam dos sofrimentos do Salvador, predomina o pensamento da Redenção no processo de ser realizada: "Ó Senhor, que mandaste o Teu Filho sofrer por nós o opróbrio da Cruz, concede-nos a graça da sua Ressurreição" (Colecta).
A ÚLTIMA REUNIÃO DO SANHEDRIN
Hoje os principais dos sacerdotes e os anciãos encontram-se numa sala do templo para deliberar pela última vez sobre os meios de prender Jesus. Vários planos foram discutidos. Será sensato apreendê-lo nestes dias de Páscoa, quando toda a cidade está cheia de estranhos que só conhecem Jesus pela ovação que recebeu três dias antes? Não haverá sequer entre os habitantes de Jerusalém muitos que aplaudiram este triunfo? Não será de temer que estejam cegamente entusiasmados com Jesus? Não, tais medidas violentas estão fora de questão por agora; pode surgir uma sedição durante a celebração da Páscoa. Os seus promotores facilmente se teriam comprometido perante Pôncio Pilatos e teriam de temer a fúria do povo. Era preferível deixar passar a festa e encontrar algum outro meio de se apoderar tranquilamente da pessoa de Jesus.
Mas estes criminosos estavam a iludir-se, querendo atrasar por sua própria vontade a morte do homem justo. Eles estavam a adiar o assassinato; mas os planos divinos, que desde a eternidade preparavam um sacrifício para a salvação da raça humana, fixaram este sacrifício precisamente para esta festa da Páscoa, que anunciará amanhã a trombeta a toda a cidade. Durante muito tempo o misterioso cordeiro foi oferecido sob a forma da verdadeira: a Páscoa está prestes a começar, que verá as sombras desaparecerem perante a realidade. O sangue do Redentor, derramado pela mão dos pontífices cegos, misturar-se-á com o das vítimas, que o Senhor já não se dignou aceitar. O sacerdócio judeu dar-se-á em breve o golpe de graça, imolando aquele que vai ab-rogar com o seu sangue a antiga aliança e selar uma nova para sempre.
A TRAIÇÃO
Mas como é que os inimigos do Salvador tomarão posse da vítima por que tanto anseiam com desejos sanguinários, sem alarido e sem barulho? Eles não tiveram em conta a traição. Um dos discípulos de Jesus pede para ser conduzido à Sua presença; Ele tem algo a propor-lhes; "Que me dareis", diz-lhes ele, "e eu vo-lo darei a vós?" Que alegria para aqueles infelizes! Eles são doutores da lei, e não se lembram do Salmo CVIII, no qual David tinha predito em pormenor esta abominável venda; nem se lembram do oráculo de Jeremias, que chega ao ponto de valorizar o preço do resgate do Justo por trinta moedas de prata. Judas pede a mesma soma aos inimigos de Jesus; concedem-na imediatamente a ele. Tudo está arranjado. Amanhã Jesus irá a Jerusalém para celebrar a Páscoa. Ao pôr-do-sol ele retira-se, como de costume, para um jardim nas encostas do Monte das Oliveiras. Mas, na escuridão da noite, como é que aqueles que vão prendê-lo o conhecerão? Judas já previu tudo. Os soldados podem prender com confiança aquele que o beijar.
Tal é a horrível iniquidade, que tem lugar no interior dos muros do templo de Jerusalém. A fim de manifestar a sua execução e de dar satisfação ao Filho de Deus, tão indignamente indignado por esta monstruosa aliança, a Igreja consagrou desde os primeiros séculos a quarta-feira à penitência. Ainda hoje a Quaresma começa na quarta-feira, e quando a Igreja, em cada uma das estações, quer que dediquemos quatro dias ao jejum e à mortificação do nosso corpo, um desses dias é a quarta-feira.
O SEXTO ESCRUTÍNIO
Nos tempos antigos, o sexto escrutínio para a admissão de catecúmenos ao baptismo realizava-se neste dia. Este escrutínio era frequentado por aqueles que, sendo dignos de baptismo, ainda não tinham sido nomeados definitivamente para o receber. Na missa houve duas leituras, tiradas dos profetas, como no dia do grande escrutínio, quarta-feira da quarta semana da Quaresma. Os catecúmenos deixaram a Igreja como habitualmente, depois do Evangelho. Mas quando o Santo Sacrifício terminava, voltavam a entrar; então um dos sacerdotes dizia-lhes: "No próximo sábado, Vigília Pascal, a tal hora, reunir-se-ão na Basílica Lateranense para o Sétimo Escrutínio; depois recitarão de cor o Símbolo que devem ter aprendido de antemão; finalmente, com a ajuda da graça divina, receberão o banho sagrado da vossa regeneração. Preparai-vos para ele através de contínuas orações e jejuns, com zelo e humildade, para que, enterrados com Cristo no baptismo, possais merecer ressuscitar com Ele para a vida eterna". Assim seja.
Em Roma, a Estação é celebrada em Santa Maria Maggiore. Partilhemos as tristezas da nossa Mãe, cujo coração experimenta a mais cruel angústia enquanto aguarda o sacrifício, que não tardará a chegar.
